Na última quinta-feira, 11, por maioria, o STF concluiu que não existe direito ao esquecimento na esfera cível que possibilite impedir, em razão do transcurso do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos em meios de comunicação.
O recurso extraordinário julgado tratava do pedido de indenização movido pelos irmãos de Aida Curi contra a TV Globo. A emissora de televisão durante a transmissão do programa Linha Direta, no ano 2000, em rede nacional publicou o nome da vítima e imagens reais do crime ocorrido em 1958.
Para o STF o direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal, pois afronta a liberdade de expressão, uma vez que os fatos ou dados publicados comunicação social analógicos ou digitais são verdadeiros e licitamente obtidos sendo possível sua publicação em canais de comunicação social analógicos ou digitais.
Para a corte, eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão ou de informação devem ser analisados caso a caso, com base em parâmetros constitucionais e na legislação penal e civil, ou seja, independente do transcurso de tempo, é possível transmitir publicamente fatos e dados verdadeiros obtidos de maneira legal.
Importante ressaltar que a posição divergente, do caso julgado pelo STF, é fundamentada no sentido de ser necessária uma apuração de valores, de maneira a sopesar qual direito fundamental deve prevalecer, se o direito de liberdade de expressão ou os direitos de personalidade pela exposição humilhante e vexatória ao ser obrigada a reviver o passado.
Existem outros países que defendem a necessidade do direito ao esquecimento e já implementaram, como é o caso dos Estados Unidos. A ideia surgiu após a publicação do artigo “Right to Privacy” (direito à privacidade) dos norte-americanos Samuel Dennis Warren (que posteriormente se tornou juiz da Suprema Corte) e Louis Dembitz Brandeis. Por isso, o final do século XIX é considerado como marco inicial do direito à intimidade e à privacidade.
O chamado “the right to be let alone”, reconhece que o direito é uma expectativa básica de privacidade em uma sociedade livre e democrática. Assim, o “interesse do indivíduo em ser deixado em paz” apenas cede ao interesse do Estado em detectar e prevenir o crime “onde a probabilidade baseada na credibilidade substitui a suspeita”. Ou seja, é o direito que uma pessoa tem de não ser lembrada para sempre por fatos que ocorreram no passado e tenham causado prejuízos a sua imagem.
Nos EUA, esse direito está diretamente ligado ao direito à privacidade. Essa posição — de defesa ao direito — foi seguida pela Suprema Corte do Canadá em diversos casos.
Todavia, importante ressaltar que, ainda que defendam a importância do direito ao esquecimento, entendem que devem existir limitações, isto é, esse direito não deveria impedir a publicação caso se trate de matéria que seja de interesse geral ou público, e a proibição à publicação não recairia sobre fatos que a lei permitisse a publicação.
Em síntese, o que parece estar em jogo é se deve prevalecer a liberdade de imprensa ou o direito de personalidade e privacidade, todos esses que são assegurados e protegidos pela Constituição Federal, tidos como direitos fundamentais.
De acordo com o entendimento de Ronald Dworkin (filósofo do Direito), todos os direitos fundamentais devem ser respeitados, tendo em vista que são essenciais para a proteção da dignidade da pessoa humana. Mas e quando se está diante de mais de um direito fundamental, em conflito entre si, qual deve prevalecer? Nesse caso, cabe sempre ao intérprete da lei buscar a harmonização, o que, como se pode perceber, nem sempre é tarefa fácil.
E você, o que pensa sobre o assunto? Já conhecia os dois posicionamentos?
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Confira a ementa do julgamento do STF:
“Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 786 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário e indeferiu o pedido de reparação de danos formulado contra a recorrida, nos termos do voto do Relator, vencidos parcialmente os Ministros Nunes Marques, Edson Fachin e Gilmar Mendes. Em seguida, por maioria, foi fixada a seguinte tese: “É incompatível com a Constituição a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais — especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral — e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível”, vencidos o Ministro Edson Fachin e, em parte, o Ministro Marco Aurélio. Afirmou suspeição o Ministro Roberto Barroso. Presidência do Ministro Luiz Fux. Plenário, 11.02.2021 (Sessão realizada por videoconferência — Resolução 672/2020/STF).”
Processo: RE 1.010.606